Inventário de Encontros 03: Recôncavo
Dia de São Jorge, Festa de Oxóssi, que dia para estar no Recôncavo da Bahia!
Cada canto de Brasis celebra uma linguagem que desperta uma memória no corpo de quem se desloca pelo território e pelas culturas brasileiras. Em Cachoeira de tantos cantos e fachadas, o patrimônio vivo e ancestral me desvelou aprendizados sobre acreditar na própria cultura.
Do “Esperando São João”, nome das festividades antes dos dias oficiais dos santos à festa de caboclo no terreiro mais antigo da cidade, fé e dignidade ditam o tom dos batuques e dos rostos orgulhosos de si. Um desfile de altivez que repete, a cada olhar forte e sincero, que somos a principal fonte de nossa sabedoria.
A bênção, Dra. Dalva.
Entre o picar o quiabo do Caruru e o contar a história do Samba de Roda, Dra. Dalva se levantou para mostrar o certificado. Ali no fundo do armário, guardado com capricho, um diploma que coloca em palavras o que há muito se sabe: estávamos diante de uma doutora em cultura. Diploma de mérito concedido pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, 79 anos de aplausos em folguedos e apresentações pelas ruas de sua cidade.
“Mas a gente precisa aprender a receber cada mérito com a dignidade de quem sabe que o corpo da cultura é um corpo da fé. É só por acreditar no que somos e fazemos que a gente tem força para resistir e viver. Até a festa é uma estratégia.”
O diploma é importante para os jovens que se questionam sobre o valor do “daqui”: “Tem gente que precisa falar de lá o tempo todo sem conseguir ver o que tem na própria história”. Aí ela mostra uma foto, um papel, uma matéria no jornal. “Tem gente que chega pra cuidar, é quem escuta primeiro e chega com cabeça baixa. Quem só quer saber de novidade, fala demais porque não acredita que a gente tem algo pra dividir e ensinar”, explica, em aula cantada, a diferença entre sabedoria e ignorância.
Só na Irmandade da Boa Morte, são décadas de cuidado e trabalho que renderam à cidade registros de bens culturais da humanidade. “Quem só quer saber do branco da saia na foto, não entende de coarar no sol”.
A bênção, Dra. Dalva.
(Fotos por Mayra Fonseca.)
A editoria Dedo de Prosa traz histórias brasileiras inspiradoras, destacando as pessoas e seus ofícios. A seção Inventário de Encontros é feita por Mayra Fonseca e traz uma coleção de suas prosas em diferentes viagens pelos Brasis.
_OndeBA, Cachoeira