Rendeiras do Cariri paraibano e Fernanda Yamamoto

(Vídeo por André Seiti e Richner Allan.)

Parceria Fernanda Yamamoto e Brasis na contação da história de sua Coleção Inverno 2016 feita com rendeiras de Renascença do Cariri paraibano:

1. Texto para imprensa, por Mayra Fonseca:

Para além de vestuário, fios entrelaçados podem contar importantes histórias brasileiras para quem posiciona-se de forma sensível para ver. Cada ponto é uma reunião de gerações de amigas e familiares em alpendres ensolarados com vista para a poesia contrastada do Cariri paraibano, cada peça é consequência da inventividade de quem cuidou de uma casa enquanto os homens da família se deslocavam a construir um país, a Renascença é um lembrete urgente de que temos algo precioso a aprender com aquelas mulheres e lugares: a sabedoria da renda.

Um saber que começa com o olhar que aprecia o próximo e com a postura do “fazer junto”. Meninas caririenses sentam-se ao lado das mais conhecedoras para primeiro observar, para depois tecer. Todo o demais, é resultado do saber lidar com o tempo com a leveza de quem aprendeu na roça que nenhuma beleza natural surge da noite para o dia: é preciso abraçar e celebrar cada pequena conquista cotidiana.

Nem tente mensurar seu processo com as métricas que nos ensinaram a usar, o vocabulário dos ensinamentos é o mesmo das canções aprendidas em festas que poucos de nós frequentamos.

O sorriso e a força acordam cedo com essas mulheres que cuidam da casa, conduzem suas crianças para o caminho da escola, plantam e colhem, desenham e preenchem rendas em suas almofadas. Cada atividade costura um pouco da autoestima de quem se orgulha de fazer renda para se expressar, de gerar renda para a família.

Esse encontro das mãos com o tempo é talvez a principal semelhança entre todas as mulheres que escreveram juntas essa trama.

Um valoroso ciclo de autoconhecimento começou no momento em que Fernanda Yamamoto foi ao encontro das rendeiras paraibanas em suas casas para ouvir seus relatos e com elas criar junto, quando as mulheres caririenses abriram suas vidas e modos de tecer para um universo que pouco as conhecia: umas viram nas outras a sua própria potência criativa, a sua capacidade de se reinventar, a sua história como também a de muitas mulheres brasileiras.

Desse encontro de narrativas femininas, das cidades com os interiores, de tantos Brasis, um precioso legado. Fica a lembrança do papel da mulher brasileira enquanto guardiã de nossa criatividade cotidiana, a evidente necessidade de nos autoconhecer, a certeza de que sempre há algo para aprender e criar a partir de nossa própria história.

2. Desfile na SPFW, com participação de Mayra Fonseca:

(Fotos: Zé Takahashi / Ag. Fotosite)

“Éramos dez mulheres num ambiente completamente novo para todas nós: rendeiras que co-criaram a coleção com Fernanda Yamamoto, sua vó, suas melhores amigas, uma excelente costureira, mulheres que trabalham com cultura e arte. Atrás da passarela e durante todo o dia, falamos sobre Brasil e artesanato, escutamos de modelos como é o seu cotidiano, conversamos sobre como estávamos nervosas – e honradas – pelo convite e reforçamos o motivo de termos dito sim: é uma alegria e responsabilidade mostrar, em primeira mão, um trabalho criativo que é sobre encontros de mulheres brasileiras.

Enquanto caminhávamos na passarela nós choramos ou rimos principalmente da reação das pessoas que tentavam entender quem era cada uma de nós…

Mas o grande passo foi mesmo de Fernanda. Ela aceitou o convite para conhecer uma região do Brasil que poucos já ouviram falar, voltou várias vezes pessoalmente para ouvir e aprender com rendeiras, estabeleceu uma relação de amizade e parceria dessas que mostram caminhos que não o da apropriação cultural. Ela se abriu, deixou-se emocionar, lembrou-se de sua trajetória e família. E, por fim, teve a sensibilidade e a coragem pra fazer da moda um suporte para um manifesto sobre o necessário encontro de mulheres brasileiras.”