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Raiz das Imagens: Cinema-ação

 

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(Projeção na aldeia RIPA. Pimentel Barbosa, MT. Raiz das Imagens/Divulgação.)

 

É com fala mansa que Eduardo Ioschpe nos conta que o Raiz das Imagens surge da ânsia e da curiosidade por conhecer uma face diferente do Brasil, povos e culturas desconhecidas por muitos de nós. À primeira vista, a pele branca e a barba ruiva não revelam o tanto de paixão e conhecimento sobre a cultura indígena que esse cineasta possui. “Em 2012, recebemos um chamado de um Xavante que pedia ajuda para a sua comunidade. Fomos conhecer esse Xavante”, conta ele. Simples assim. “A gente também queria provar um cinema que vem de dentro, que aproxima e se faz com amor.” Cinema pelos índios, para os índios. Nada melhor define o Raiz das Imagens.

 

Ioschpe, é um dos quatro membros do coletivo independente que passa temporadas em aldeias brasileiras enquanto realiza oficinas de técnicas audiovisuais com os índios. Nada de formar cineastas; o projeto itinerante busca produzir registros visuais problematizadores, reflexivos e sem demagogia acerca da realidade atual. Preservar, valorizar e fortalecer a cultura de povos originários também está entre os objetivos do Raiz das Imagens.

 

Geralmente, o trabalho envolve os mais jovens, que filmam algo importante para a aldeia: um ritual, uma festa e o que mais atravessar o cotidiano da tribo, da alimentação à construção de casas. “Gostamos desse formato onde a câmera atua como um elemento de conexão entre as gerações mais novas e os velhos detentores da memória histórica. Por isso, o cinema-ação: uma história a ser encontrada, um ritual a ser resgatado ou uma prática que volta a se realizar”, completa Rodrigo Soares, outro membro do coletivo. Como na cultura indígena o mais velho não manda no mais novo, é através do vídeo que o elo entre jovens e suas tradições é incentivado e recuperado. Um ato importante, à medida que essa ancestralidade tem perdido espaço entre uma nova geração de índígenas mais interessada na cultura do homem branco.

 

O resultado são mini documentários projetados dentro das aldeias participantes, provocando autoconhecimento, debate e reflexões. Ao exibir os filmes em outras aldeias, o coletivo também cria uma espécie de rede de diálogo orgânica, uma troca de cultura entre comunidades. Como o trabalho ainda é exibido nas cidades do waradzu (homem branco), ajuda a desmitificar certas visões e preconceitos em relação ao índio “contemporâneo”, por assim dizer: esse índio que não é mais aquele nu e supostamente puro, que povoa o imaginário de tanta gente.

 

(Trecho do documentário “Uma casa, uma vida”. Raiz das Imagens/Divulgação.)

 

Um dos documentários realizados pela equipe foi o “Uma casa, uma vida”, produzido graças a um financiamento coletivo. O filme, que discute a questão da moradia tradicional Xavante versus a penetração do programa Minha Casa Minha Vida em algumas aldeias, ganhou o prêmio do festival EntreTodos, em 2014. O coletivo não esconde a satisfação, afinal, o dinheiro ajudou o Raiz das Imagens a investir em novos equipamentos e viagens. Para além da premiação, a motivação do grupo foi potencializada pela reflexão que o documentário promoveu nas aldeias. Para eles, isso sim foi o maior prêmio: ver o cinema-ação funcionando.

 

A equipe varia de tamanho de acordo com o projeto e com o momento pessoal de cada um, mas uma coisa permanece sempre igual: “somos uma hierarquia sem dono, horizontais como uma família. Nos tratamos assim como um processo de trabalho – sempre a melhorar – mas com muito amor e carinho”, diz Eduardo, com naturalidade. O grupo já visitou Guaranis e Pataxós, apesar de o trabalho se concentrar em três aldeias Xavantes do Mato Grosso. “Não é nada fácil. Existe competitividade, boicote e muito ceticismo em várias aldeias. Os Xavantes em geral são duros, mas amáveis com o tempo”, comenta, enquanto mexe na barba tranquilamente. Paciência não parece ser um problema para ele, nem para seus companheiros de coletivo; a experiência do grupo revela que de nada adianta chegar cheio de iniciativa se a comunidade não se une e está junto.


A vontade de seguir experimentando é tanta que, neste ano, pretendem conectar mais etnias. Segundo Rodrigo, o Raiz das Imagens está sendo reestruturado, envolvendo mais pessoas e preparando novas visitas para ampliar os trabalhos. Para além do cinema, o coletivo também começou a organizar feiras de trocas de sementes crioulas (sem agrotóxicos), debates e oficinas de técnicas agroflorestais. Mais ação, sim, mas com muita calma e paciência.

 

(Escola indígena Mario Juruna. Barra do Garças, MT. Raiz das Imagens/Divulgação.)

 

(Fotos de Divulgação Raiz das Imagens.)

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

_Data de início: 25/03/2015

_Data de encerramento: 31/12/2015

_Observações: O Raiz das Imagens convida todos a assistirem e compartilharem. O coletivo também aceita doações em dinheiro e está de portas abertas para quem quiser ajudar como voluntário. Por meio da página web do coletivo: www.raizdasimagens.org ou entrando diretamente em contato com rodrigo@raizdasimagens.org e edu@raizdasimagens.org . "É importante para nós o apoio das pessoas que acreditam no projeto, para que possamos seguir com autonomia e neutralidade buscando sempre focar nos desejos das comunidades." _ Eduardo Ioschpe, Raiz das Imagens.

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