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Retrato Falado 04: Seu Cabral

 

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Retrato Falado: instantâneo em forma de texto

 

Dica do seu Cabral pra ficar rico: faça da água sua terra. Um: escolha um naco de rio – de preferência bonito, melhor ainda se for de frente pro mar. Que tal a Guarda do Embaú? Que tal defronte à última curva do Rio da Madre, entre a praia e as pedras, bem onde o mar vem trazer robalos, corvinas, tainhas e paratis? Dois: arranje um bote, uma pá e um carrinho de mão. Um de cada, pra começar. Com o tempo, há que se precisar de mais. Só de pás, seu Cabral gastou 180. Carrinhos de mão, uns 120. Viagens de bote, foram pra lá de 48 mil. Tudo anotado em caderninho. Três: despeje a areia da praia no leito do rio. Sempre que acabar, vá buscar mais. Mas saiba: dependendo do tanto de continente que se quer construir, pode levar um bocado de tempo. Seu Cabral mesmo era ainda guri quando inventou de aterrar a baiazinha onde se erguia, mediante palafitas, seu rancho de pesca. Terminou já marmanjo, quarenta anos depois. E o que era rio virou terra. E então virou estacionamento, que a Guarda, antes vila de pescador, agora era praia de turista. Só na alta temporada, seu Cabral diz que tira uns mil reais por dia. “Eu me considero o maior milionário da Guarda”, resume. “Com uma pá fiz meu tesouro”. O rancho? Continua lá, rodeado de carros. Só que agora cravado no chão.

 

Valdemiro Alvim Correa (Cabral é apelido), pescador na Guarda do Embaú, Santa Catarina. Novembro de 2014.

 

(Foto por Xavier Bartaburu).

 

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