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Retrato Falado 03: Luiz Oião

 

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Retrato Falado: instantâneo em forma de texto

 

Pescador que é sabido não entra no mar em dia de Finados. Diz o povo que dá azar. Quem duvida, que procure Luiz Oião na Praia do Pontal, em Ilhéus, onde no fim da tarde os pescadores todos se ajuntam pra trocar conversa e recordar os fatos do passado. Estória pra contar, o homem deve ter de monte, pois lá se vão mais de quarenta anos no mar. Mas a que ele conta é uma só, e é a que todo o mundo quer ouvir. Foi bem numa manhã de dois de novembro – dia de Finados. Era ele e mais uns companheiros, no ermo do mar, lá onde a água alcança três mil metros de fundura. Nem deu tempo de Oião sentir a fisgada: o peixe mordeu, o cabra já foi logo pra baixo. Era um marlim-azul, três toneladas de pura tenacidade, e o sujeito preso a ele por uma linha que nunca se viu arrebentar. “A linha enroscô nos quatro dedos da mão e eu fui esquiando por uns duzentos metros”. Então, o impossível: a linha estourou, o bicho safou e Oião renasceu. Vivos homem e peixe, pra cada um contar a história à sua maneira. Sem mais delongas, Oião resume: “Foi milagre”.

 

Luiz Moreira, pescador em Ilhéus, Bahia. Novembro de 2010.

 

(Foto por Valdemir Cunha, publicada no livro Brasil Invisível. Edigora Origem, 2012.)

 

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