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BRASIS. CULTURAS E COTIDIANOS DO BRASIL.

Artista de Plástico

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(Talita Oliveira em Belém. Foto Bruno Carachesti/Jornal Diário do Pará)

 

Nas paredes das capitais do Norte do Brasil, linguagens urbanas ensinam a aproximar imaginários e andarilhos, artistas e seus vizinhos. Retratos e obras são espalhados pelos caminhos onde as pessoas passam e sem mais legendas: esse museu tão vivo! O Artista de Plástico é um projeto que abre as portas das galerias e leva as artes visuais para as ruas; é um movimento em direção ao Norte e para dentro.

 

(Recomendaram que eu lesse sobre o Artista de Plástico, “um Brasis sobre o Norte e nas ruas do Norte”: disse o amigo que incentiva essa minha vontade de autoconhecimento. Artista, de Plástico? Gostar de nomes tem disso: eu precisava escutar mais sobre o projeto! Conversar com brasileiros dá nisso: depois de falar com a Talita Oliveira, já começo a me organizar para ir ao Acre!)

 

Brasis: O que você carrega do lugar onde nasceu?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: Nasci e vivo até o momento em Rio Branco, Acre, mais precisamente no Bairro Quinze: um dos bairros mais antigos da capital.
Comigo levo o tempo, a noção do tempo. Em Rio Branco não existe (pelo menos eu não sinto que existe) a pressa que é comum nas grandes capitais. O tempo passa mais devagar. Quando estou em outra cidade e me vejo envolvida nessa pressa, nesse outro tempo, sempre me lembro do Acre e desacelero.

 

Brasis: O que é o projeto Artista de Plástico?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: O Artista de Plástico é um projeto de intervenção urbana que utiliza o suporte lambe lambe e envolve 20 artistas visuais de quatro capitais da Amazônia, sendo cinco de cada cidade. O projeto está em execução e até o momento já passou por Belém–PA e Boa Vista-RR. Está passando agora por Rio Branco–AC e ainda vai passar por Porto Velho–RO. Os artistas que participam até o momento são: de Belém – PP Condurú, Elaine Arruda, Pablo Mufarrej, Nando Lima e Coletivo Pitiú; de Boa Vista – Jaider Esbell, Ana Mendina, Isaias Miliano, Edinel Pereira e Carmezia Emiliano; de Rio Branco – Danilo De S´Acre, Dalmir Ferreira, Ivan Campos, Simone Bichara e Deisi Mello. Os artistas de Porto Velho serão convidados assim que o projeto chegar lá. A inspiração de cada artista é diferente: há inspirações da memória, das relações, dos afetos e da natureza em seu sentido mais amplo.

 

Os artistas são fotografados em seus ateliês e é feita uma reprodução fotográfica de uma obra de cada. Os retratos, junto com a reprodução de uma de suas obras, são ampliados em grandes formatos e fixados nas ruas, como lambes. As obras e os retratos dos artistas de Belém-PA ganharão as ruas de Boa Vista-RR e vice-versa. As obras e os retratos dos artistas de Rio Branco-AC irão para as ruas de Porto Velho-RO e vice-versa. Ao final do projeto, será publicado um catálogo ilustrado com fotografias das ações nas quatro cidades, além de entrevistas com os artistas envolvidos. O catálogo será distribuído gratuitamente para bibliotecas e instituições culturais de toda a região Norte.

 

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(Intervenção em Belém. Retrato e obra da artista Carmezia Emiliano)

 

Brasis: Como surgiu o Artista de Plástico e qual é a sua principal crença?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: O Artista de Plástico surgiu a partir da observação do movimento do grafite, arte que nasce na rua e atualmente se desloca para o espaço das galerias de arte tradicionais. O projeto busca fazer um deslocamento semelhante, mas no sentido inverso: das galerias e demais espaços fechados para as ruas. Além disso, também leva para as ruas a figura do artista. O objetivo disso é proporcionar o encontro da arte e do artista (mesmo que só com a imagem do artista) com a rua, com as pessoas. Despertar a curiosidade, instigar. As intervenções realizadas pelo projeto não levam nenhum crédito, elas não respondem nada, são pontos de interrogação ou simplesmente de contemplação nesses ambientes urbanos. O nome é uma brincadeira com o termo Artista Plástico: há uma música do Titãs chamada Flores, que diz que “as flores de plástico não morrem”; talvez os artistas de plástico também não.

 

Brasis: Quem faz o Artista de Plástico?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: O projeto Artista de Plástico foi aprovado pelo Programa Amazônia Cultural 2013 do Ministério da Cultura/Governo Federal. A concepção do projeto, coordenação e fotografia é feita por mim – Talita Oliveira – e o projeto gráfico e identidade visual é da Selene Fortini. Em cada cidade que o projeto passa, há uma equipe local. Em Belém: Tati Brito (produção) e Danielle Franco (assessoria de imprensa e comunicação); em Boa Vista: Kaline Barroso (produção) e Edgar Borges (assessoria de imprensa e comunicação); em Rio Branco: Giselle Lucena (assessoria de imprensa e comunicação); e em Porto Velho: Olegária Porto (produção) e Marcela Bonfim (assessoria de imprensa e comunicação). Além, claro, de todos os artistas visuais que aceitam o convite do projeto, e abrem seus espaços e processos.

 

Brasis: Qual foi o critério de seleção dos 20 artistas que participam do Artista de Plástico?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: Usei minha rede de contatos para pedir indicações de artistas. Pedi que não fossem artistas que desenvolvessem trabalhos na rua, pois a intenção do projeto é levar para a rua o que e quem não está lá. Pedi também que não fossem artistas que utilizem principalmente a fotografia, porque ela é o pano de fundo do projeto. O critério utilizado para convidar os artistas foi principalmente intuitivo, mas também observei os nomes recorrentes nas sugestões que foram enviadas, a questão de gênero (muitas indicações eram de artistas homens) e também tentei compor uma diversidade de linguagens, técnicas, estilos e personalidades dentro desse conjunto de artistas. Depois dessas questões, enviei o convite para os artistas e felizmente a maioria deles aceitaram.

 

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(Intervenção em Boa Vista. Retrato do artista Pablo Mufarrej ao lado de sua obra Eu, o horizonte e minha caverna – Primeiro movimento – a cor, o espaço e a experiência)

 

Brasis: Você deve ter escutado excelentes histórias no contato com os artistas. Conte-nos uma delas.

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: Acredito que a parte mais interessante do projeto, para mim, é essa conversa com os artistas. Para citar apenas um desses momentos, logo no início da circulação do projeto, em Belém, conversei com o Pablo Mufarrej dentro de sua obra Eu, o horizonte e minha caverna: 1º movimento – a cor, o espaço e a experiência. Conversar com o artista dentro de sua obra foi uma experiência muito interessante, sinestésica. É uma obra de instalação minuciosa, cheia de elementos, que foi montada ao longo de dias e ficou aberta ao público por apenas algumas horas, em um evento de ocupação da Oficina Santa Terezinha, metalúrgica que funciona no Porto do Sal. Eu perguntei ao Pablo qual era o seu sentimento em relação a isso, dias de trabalho, para uma existência tão curta da obra. E ele me deu uma resposta fantástica: “É a vida, como cozinhar. Tratar com dignidade e respeito cada elemento. Não com sentido de permanência, mas com sentido de existência. Se deu nesse tempo, foi materializado para isso e se desfaz”. Estávamos falando do trabalho do Pablo, mas, ao mesmo tempo, o que ele disse coube perfeitamente para o trabalho que desenvolvo com o projeto Artista de Plástico.

 

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(Intervenção em Belém. Retrato e obra do artista Jaider Esbell)

 

Brasis: Podemos dizer que um dos objetivos do projeto é estimular o autoconhecimento do Norte do Brasil?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: A região amazônica é enorme, cheia de artistas incríveis, mas, pelo menos nas artes visuais – com exceção da fotografia, que já se articula há algum tempo por meio de redes físicas e virtuais – nós pouco nos conhecemos. Conhecemos a cena da nossa cidade e, para fora disso, nossa atenção está voltada principalmente para outras regiões do país. Muitas vezes conhecemos artistas do Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e não conhecemos os artistas das outras cidades da nossa região. Um dos objetivos do projeto é promover esse intercâmbio, fazer essa provocação. A ação do projeto é, principalmente, de dentro para dentro, da Amazônia para Amazônia. O projeto envolve quatro cidades da região norte, mas o catálogo contendo as entrevistas com os artistas, relato da experiência do projeto e fotos das obras, artistas e intervenções, será distribuído gratuitamente para bibliotecas e instituições culturais de toda a região norte.

 

Brasis: O que você acha que nós não sabemos e deveríamos saber sobre o Brasil?

 

Talita Oliveira, Artista de Plástico: Eu não sei quem são todos esses nós… Essa percepção sobre o Brasil, para além da história oficial, é uma descoberta e construção que se dá e se transforma a todo o momento no contato com o outro.

 

(Fotos Divulgação Artista de Plástico. Peça autorização.)

 

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